3 de dez. de 2008

"Produção absoluta não quer dizer muita coisa"


Caro Rosimar


Que bom ver sua opinião de criador e jornalista sobre o Gir Leiteiro em 4 atos.


Quando escrevi o artigo publicado no blog Girbrasil foi justamente para criar polêmica e suscitar debate sobre o assunto.


O Gir Leiteiro veio para ficar e ocupar definitivamente seu espaço na pecuária tropical por suas qualidades como animal adequado e integrado aos diversos sistemas de produção.


Um longo e difícil caminho foi percorrido para demonstrar isso. Ao mesmo tempo a raça evoluiu e os reprodutores atualmente produzem filhos melhores genética e fenotipicamente do que os pais. Isso é seleção e melhoramento bem conduzido, com respaldo científico e de estudos técnicos. Demonstração disso são ganhos genéticos da ordem de 1% ao ano nos rebanhos de Gir Leiteiro.


Por outro lado, as altas lactações são formas de demonstrar a máxima capacidade de produzir leite (só respondem a tratamentos e a desafios aqueles animais que possuem capacidade para isso). O que não podemos é generalizar e conceituar que esses animais são os ideais e únicos. Aqueles produtores que não usam de artifícios têm vacas tão boas quanto essas ‘turbinadas’, mas não querem fazer esse ‘jogo’ como forma de marketing.


Em Melhoramento Genético, produção absoluta não quer dizer muita coisa. Em Genética Quantitativa se trabalha com dados de população (não apenas informação de um animal) e, através de análises apropriadas, se procura predizer o Valor Genético dos animais como Pais, através do Valor Genotípico de suas Progênies (PTA), diferente de seu Valor Genotípico como Indivíduo, com base apenas em seu desempenho e do pedigree.


Quando se implantou o PNMGL foi para isso – distinguir animais superiores que transmitiriam à progênie essa superioridade. Até então prevalecia apenas informações de lactações e pedigrees, sendo impossível se comparar ou interligar (conectividade) em uma mesma base essas informações fornecidas pelos criadores. O Teste de Progênie foi conduzido para esse propósito, assegurar o uso de um touro para melhorar geneticamente o rebanho, com delineamento apropriado para retirar efeitos que pudessem mascarar seu valor como reprodutor.


A Avaliação Genética de Vacas também tenta eliminar efeitos de ambiente, acasalamentos dirigidos, tratamentos diferenciados e outras coisas mais, através de modelos matemáticos que identifica seu Mérito Genético pelo seu Genótipo e não pelo fenótipo (produção absoluta). O que se deve enaltecer é o Valor Genético da vaca dentro de cada rebanho, sempre comparativo. Uma vaca de um rebanho, a não ser por Sumário de Avaliação, não pode ser comparada com outra de rebanho distinto.


Por outro lado, o Gir Leiteiro saiu dos galpões de Torneio Leiteiro, onde ficava confinado, marginalizado, isolado dos demais e sem visibilidade. Foram para pistas de julgamento e mostraram a todos, inclusive aos incrédulos criadores de Gir Padrão, que os animais eram caracterizados dentro dos padrões exigidos para registro da raça, mas com morfologia e conformação de biótipo de animal com funcionalidade leiteira e tipo mais moderno, com quartos posteriores mais desenvolvidos, tetas menores e bem postadas, aprumos adequados e estrutura óssea vigorosa.


O que não podemos é suscitar que Gir Leiteiro é da elite e que só animais possuidores de altas lactações é que devem ser utilizados. Pelo contrário, o mercado externo hoje, com experiência própria dos importadores, observaram que os animais dos rebanhos ‘de cocheira’ tiveram a mesma performance de animais ‘de capim’ quando submetidos ao manejo normal de seus países. De outro lado nunca conseguiram reproduzir as lactações recordes.


Tudo isso faz com que se questione o Controle Leiteiro Oficial – e se propaga como se fossem lactações ‘fictícias’ - porque nunca se vendeu mais de 10.000 kg de leite de uma vaca Gir – da mesma forma que é impossível ter uma média de 49 kg/dia de leite na lactação. O que se faz, na realidade, é conseguir, no dia do Controle Leiteiro, ‘fazer a vaca produzir aquela quantidade de leite’, que não se repete durante em todos os dias da lactação. Gir Leiteiro em manejo sem artificialismo produz e entrega na cooperativa no máximo 6 a 8 mil kg (média na lactação de 21 kg/dia, com pico de 30 kg).


Ledo engano daqueles que acham que pecuária é hobby - por isso o Gir Padrão deixou de existir, ficou sem finalidade zootécnica e Carreou na falta de representatividade. Vendiam animais uns para os outros, para pequenos produtores de gado mestiço. Esses pequenos hoje querem Gir Leiteiro e não qualquer Gir, porque beleza sem finalidade zootécnica não interessa ao mercado consumidor. Da mesma forma, com o Gir Leiteiro de cocheira....


Se investidores e empresários querem ter hobby, especular, ter lucros, bom para aqueles criadores e selecionadores que estão vendendo. Estão repondo seus investimentos e comprando propriedades rurais e re-investindo na estrutura física visando melhorias de produtividade e aumentando a receita. Isso sim é bom para o Gir Leiteiro e para seus criadores.


Outros leilões de Gir Leiteiro que estão ocorrendo, como o Leilão da Jasdan, do criador Onofre Ribeiro, que oferta animais com longa tradição de produtividade e melhoramento genético, o do Sílvio Queiroz, dos meus competentes colegas Aníbal Vercesi e João Cruz Reis Filho, de outros que ainda ocorrerão até o final do ano, como do Joaquim Souto da Bahia, estão mostrando outra realidade – Gir Leiteiro de qualidade e com preço justo agregado ao trabalho sério e sem maquiagem e, que o ‘picadeiro com jogo de luzes’ é só de um grupo agenciado por certos promotores.



Ivan Luz Ledic

Médico Veterinário, MSc. em Melhoramento Animal,

DSc. em Produção Animal

ex-Diretor Técnico da ABCGIL e

Pesquisador aposentado da Embrapa Gado de Leite




6 comentários:

caio disse...

É, Dr. Ivan, realmente se era para suscitar, parece que consegui, não e mesmo.

Do seu artigo, dos comentários publicados e também dos não publicados, das conversas frente a frente, por email, que foram travadas em cima do artigo e também dos quatro atos do Rosimar, consegui aprender e reforçar meu caminho seletivo no Gir, aprendi nas entrelinhas.

Temos que fazer o Gir produzir leite sem perder a produtividade, mais também o que podemos fazer para dar confiabilidade nessa praga de Controles Leiteiros projetados, como foi postado "fictícias".

Como pesquisador e fomentador de ideias qual a sua opinião para acabar com a ultima praga que assola os rebanhos do GIR LEITEIRO, por que a praga da caracterização morfologica essa já não assunta mais ninguem no processo seletivo.

Anônimo disse...

Prof. Ivan Ledic,
Com a obrigatória reverência que lhe devo, permita-me:
Quando o Sr. escreveu que o Gir Padrão deixou de existir, certamente o Ex- Diretor Técnico da ABCGIL deixou escapulir uma provocação, já que os outros Diplomas constantes de Vossa identificação proibem tamanho equívoco.
Provávelmente, confusão semelhante permite a um colega seu, durante os leilões, enaltecer as maquiagens nos picadeiros com jogo de luzes.
E finalizando: Pensava que meia dúzia de "investidores" vendendo gado entre si fosse coisa de agora !
Respeitosamente,
Alzeir Campanati Antunes.

Guilherme Ricaldoni e Marcos André Ricaldoni de Miranda. disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
caio disse...

Uai, Guilherme, se for azubezado, registrado na ABCZ e mais produzindo leite por mais de dez meses seguidos, já não dou a minima importancia para a "pureza racial".

O Dr.Ivan puxou a sardinha pro lado ruim, agora vai ser escumungado, hehehehehehehe.

Guenta Dr.Ivan, foi do ceu ao inferno, somente com duas opiniões postadas no BLOG GIR BRASIL, o maior veiculo de fomentação do GIR MUNDIAL, o divisor de aguas, o ACB e DCB do Gir Brasileiro.

Anônimo disse...

Respeito o que o Mestre Ivan Ledic falou..inclusive até ontem tivemos um debate caloroso sobre este assunto no msn!

Porém quero discordar de uns fatos:
- O Gir padrão...ainda não foi testado..mas começou a ser.. vem surpresas boas por aí no teste da Gir Goiás /Embrapa!
- O Moet tá sendo implantado..
- Muitos criadores fizeram o Igenity de seus animais, com resultados equivalentes e em muitos casos superiores ao Gir Leiteiro.
- Muitos estão começando o controle leiteiro...muitas surpresas aparecendo...

Daqui uns anos...com animais provados, fazendas com controle leiteiro, será que os compradores de genetica irão preferir os animais raçudos ou não?

Este é meu questionamento..por acreditar na 1ª hipotese...eu comecei um trabalho neste nível agora!

Respeito o Gir Leiteiro...tenho animais nestas linhagens..porém acredito no potencial de leite, na rusticidade do Gir Padrão..

Um forte abraço,

Roberto Bolsanello
Médico Veterinário
Especialista em Bovinocultura Leiteira - UFLA/MG
Mestre em Medicina Veterinária Preventiva - UNESP / Botucatu-SP.

PS.: Se preparem pra ver muito leite no gado padrão!!!

Gir das Paineiras disse...

Mais uma vez parabéns pelo artigo Dr. Ivan, concordo e muito com o senhor quando cita que criadores do exterior que compram genética brasileira têm notado que animais com lactações turbinadas são iguais aos animais criados no "capim", e também sou da mesma opinião que o senhor quando diz que dois animais não podem ser comparados estando eles em fazendas diferentes, isso para quem é pesquisador como o senhor, o Beto, e outros é simples de perceber, pois sempre fizeram experimentos e sabem delinear um projeto e a interferencia que o meio ambiente tem nos resultados, agora para alguns criadores é difícil entender este conceito.

Acho que eu entendi quando o senhor disse que o Gir Padrão se enquadrava na pecuária de hobby, creio que no passado o Gir Padrão era apenas selecionado quanto ao seu caráter racial, deixando de lado o leite, acho que todos já ouviram ao menos uma história de criador que descartava vaca por dar muito leite (cursava bezerro) e por não ser tão boa racialmente mesmo que ótima no leite, mas vejo que hoje os criadores de Padrão perceberam que o caminho do Gir é o leite, tanto que temos hoje o teste da GirGoiás, o Igenity sendo realizado em animais Padrão com bons resultados, criadores fazendo controle leiteiro e alguns como o Bi (simbolo do Gir Padrão) entrando em torneios e na ABCGIL. Vejo este como o caminho a ser trilhado pelo Gir como um todo, um animal muito produtivo, com produção correta e sem artificialismo, com caracterização racial dentro do exigido, enfim um animal moderno para a pecuária de hoje.

Um Abraço

Zé Eduardo Mello
Médico Veterinário
Gir das Paineiras - Itapetininga/SP