1 de mai. de 2009

À procura de olhos para enxergar um animal belo e funcional



Prezado Rosimar,



Boa noite. Inicialmente manifesto enorme satisfação em reconhecer a importância e a repercussão da Revista Girbrasil entre os criadores. Tenho acompanhado o debate acerca do artigo do Ideraldo, e embora com uma vertente menos poetizada gostaria, com sua licença, expor alguns pontos de vista.

1) Sobre uma das idéias centrais do artigo, ou seja, os erros cometidos por alguns selecionadores da raça Gir, pouco tenho a acrescentar. Os fatos falam por si. O destino traçado, não por Darwin, mas por criadores da raça Gir na década de 60 e 70, levou alguns de meus mestres na Medicina Veterinária a referirem-se ao Gir, já na década de 80, como raça em declínio e para os mais exaltados, como raça em extinção. Esse era o conhecimento disponível nos bancos das Universidades àquela época: uma raça tardia, com problemas de fertilidade e pouco reconhecida como leiteira. Isso é fato e não uma opinião.

2) Também é fato que o reconhecimento da aptidão leiteira da vaca Gir pelos produtores de leite foi o principal motivo para o retorno da raça às melhores prateleiras. Some-se a isso a mitigação dos impactos relativos aos problemas reprodutivos. Embora entendendo que ainda há muito a fazer, principalmente quanto a consangüinidade, fertilidade e precocidade, não reconhecer os méritos dos programas de seleção para leite, individuais ou institucionais é, no mínimo, ingratidão.

3) A respeito do apaixonado e até hilário embate poético travado entre os giristas Luciano Ferraz e Alzeir Campanati sobre a beleza da raça, não serei hipócrita. Digo isso porque é inquestionável o fascínio e o desejo que determinados exemplares despertam em criadores e leigos. É quase uma sessão de hipnose! Beleza é mesmo fundamental. No entanto, respeitando os padrões da raça, resta-nos a liberdade de sentirmos, cada um a seu tempo, o que é belo. Por isso somos uma associação de criadores com erros e acertos, e não uma sociedade anônima com presidentes e diretores. Mas o que é belo a um, tende ser a todos. Difícil é, às vezes, admitir a concordância.

4) Por fim, sobre os temas zootécnicos me estenderei um pouco, mas para rever o obvio. Se a seleção pelo fenótipo é uma tentativa de alteração da freqüência de determinados genes nas gerações subseqüentes, pelo menos por enquanto, não há como imprimir uma característica em determinada população sem privilegiar a reprodução de animais que a manifestem. Se a característica é ligada ao sexo, restam-nos os testes de Progênie ou de Irmãs para identificar os indivíduos portadores dos genes desejados.

Some-se a essa observação a conclusão que determinadas características produtivas correlacionadas com a produção de leite, quais sejam, compostos de úberes e capacidade respiratória e digestiva, dão ao animal uma angulosidade própria dos animais produtores de leite. Tudo isso para sustentar uma necessidade metabólica de síntese diária de quilos e quilos dos constituintes do leite. Então, se quisermos animais leiteiros, teremos que selecionar linhagens de animais com características leiteiras. Assim, a moderna vaca Gir Leiteira apresentará uma angulosidade característica de raças leiteiras. Desconfio seriamente que não haverá como fugir disso.

No entanto, nada impede que ela seja bem caracterizada, tenha uma cabeça harmônica, um cupim bem posicionado, uma garupa plana e ampla, dentre outras características presentes nos genes de alguns planteis. Na verdade, já temos no Brasil muitos animais com esse padrão. Um animal funcional e belo à maioria dos olhos. Poderíamos citar vários, mas em função dos envolvidos nessa discussão, lembrei-me da jovem Elvira, filha do Luso Cal, campeoníssima em pistas e com alguns controles leiteiro acima de 27 kg na primeira cria. Pelo menos por enquanto, animais como esses é que me hipnotizam.

Boa noite e obrigado pela paciência!




Flavio Augusto Salim Nogueira
Medico Veterinário
Girista e Professor da PUCMinas
Belo Horizonte (MG)




Entenda o caso:

  1. Artigo do Ideraldo
  2. Comentário de Luciano Ferraz
  3. Comentário de Alzeir Campanati
  4. Réplica de Luciano Ferraz
  5. Comentário de Flávio Salim

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